quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Manifesto dos Invisíveis

Motorista, o que você faria se dissessem que você só pode dirigir em algumas vias especiais, porque seu carro não possui airbags? E que, onde elas não existissem, você não poderia transitar?

Para nós, cidadãos que utilizam a bicicleta como meio de transporte, é esse o sentimento ao ouvir que "só será seguro pedalar em São Paulo quando houver ciclovias", ou que "a bicicleta atrapalha o trânsito". Precisamos pedalar agora. E já pedalamos! Nós e mais 300 mil pessoas, diariamente. Será que deveríamos esperar até 2020, ano em que Eduardo Jorge (secretário do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo) estima que teremos 1.000 quilômetros de ciclovias? Se a cidade tem mais de 17 mil quilômetros de vias, pelo menos 94% delas continuarão sem ciclovia. Como fazer quando precisarmos passar por alguma dessas vias? Carregar a bicicleta nas costas até a próxima ciclovia? Empurrá-la pela calçada?

Ciclovia é só uma das possibilidades de infra-estrutura existentes para o uso da bicicleta. Nosso sistema viário, assim como a cidade, foi pensado para os carros particulares e, quando não ignora, coloca em segundo plano os ônibus, pedestres e ciclistas. Não precisamos de ciclovias para pedalar, assim como os carros e os caminhões não precisam ser separados. O ciclista tem o direito legal de pedalar por praticamente todas as vias e tem preferência, garantida pelo Código de Trânsito Brasileiro, sobre todos os veículos motorizados. A evolução do ciclismo como transporte é marca de cidadania na Europa e de funcionalidade na China. Já temos, mesmo na América do Sul, grandes exemplos de soluções criativas: Bogotá e Curitiba.

Não clamamos [só] por ciclovias, clamamos por respeito. As leis de trânsito colocam em primeiro plano o respeito à vida. As ruas são públicas e devem ser compartilhadas entre todos os veículos, como manda a lei e reza o bom senso. Porém, muitas pessoas não se arriscam a pedalar por medo da atitude violenta de alguns motoristas. Estes motoristas felizmente são minoria, mas uma minoria que assusta e agride.

A recente iniciativa do Metrô de São Paulo de emprestar bicicletas e oferecer bicicletários é importante. Atende a uma carência que é relegada pelo poder público: a necessidade de espaço seguro para estacionar as bikes. Em vez de ciclovias, a instalação de bicicletários deveria vir acompanhada de uma campanha de educação no trânsito e um trabalho de sinalização de vias, para informar aos motoristas que ciclistas podem e devem circular nas ruas da nossa cidade. Nos cursos de habilitação não há sequer um parágrafo sobre proteger o ciclista, sobre o veículo maior sempre zelar pelo menor. Eventualmente, cita-se a legislação a ser decorada, sem explicá-la adequadamente. E a sinalização, quando existe, apenas proíbe a bicicleta, nunca comunica os motoristas sobre o compartilhamento da via, regulamenta seu uso ou indica caminhos alternativos para o ciclista. A ausência de sinalização deseduca os motoristas, porque não legitima a presença da bicicleta nas vias públicas.

A insistência em afirmar que as ruas serão seguras para as bicicletas somente quando houver milhares de quilômetros de ciclovias parece a desculpa usada por muitos motoristas para não deixar o carro em casa, que dizem "só mudarei meus hábitos quando tiver metrô na porta de casa", enquanto continuam a congestionar e poluir o espaço público, esperando que outros resolvam seus problemas em vez de tomar a iniciativa para construir uma solução.

Não podemos e não vamos esperar. Precisamos usar nossas bicicletas já, dentro da lei e com segurança. Vamos desde já contribuir para melhorar a qualidade de vida da nossa cidade. Vamos liberar espaços no trânsito e não poluir o ar. Vamos fazer bem para a saúde (de todos) e compartilhar, com os que ainda não experimentaram, o prazer de pedalar. Com força e determinação, iremos construir nossos espaços nas cidades e ser a vanguarda de um futuro sustentável para as próximas gerações.

Preferimos crer que podemos fazer nossa cidade mais humana do que acreditar que a solução para os nossos problemas é alimentar a segregação com ciclovias. Existem alternativas mais rápidas e soluções que serão benéficas a todos, se pudermos nos unir para construirmos juntos uma cidade mais humana.

A rua é de todos. A cidade também.


Nós, que também somos o trânsito:

Alberto Pellegrini
Alexandre Afonso
Alexandre Catão
Alexandre Loschiavo (Sampabiketour)
Alex Gomes ( U-Biker )
Alonzo "chascon" Zarzosa (Terrorista Latino)
Ana Paula Cross Neumann (Aninha)
André Mezabarba - BH
André Pasqualini (CicloBR)
André Vinicius Mulho da Costa
Antonio Lacerda Miotto (Pedalante)
Aylons Hazzud
Ayrton Sena Santos do Nascimento
Beto Marcicano (Super Ação!)
Bruno Canesi Morino
Bruno Gola
Carolina Spillari
Célia Choairy de Moraes
Chantal Bispo (Eu vou voando)
Daniel Ingo Haase (Fahrrad)
Daniel Albuquerque
Daniel das Neves Magalhães
Daniel Moura (Maceió - AL)
Daniela Pastana Cuevas
Danilo M May
Eduardo Lopes Merege
Eduardo Marques Grigoletto (CicloAtivando)
Evelyn Araripe
Fabiano Faga Pacheco
Fabrício Zuccherato (pedal-driven)
Flávio "Xavero" Coelho
Felipe Aragonez (Falanstérios)
Felipe Martins Pereira Ribeiro
Fernando Guimarães Norte
Frank Barroso (Movimento Cidade Futura)
Gustavo Fonseca Meyer
Hélio Wicher Neto
Ian Thomaz (Enquanto não Há Fogo)
Jeanne Freitas Gibson
João Guilherme Lacerda
José Alberto F. Monteiro
Juliana Mateus
Juliana da Silva Diehl
Jupercio Juliano de Almeida Garcia
Laércio Luiz Muniz (Onipresente Ausente)
Leandro Cascino Repolho
Leandro Kruszielski (meandros)
Leandro Valverdes
Leonardo Américo Cuevas Neira
Luciano César Marinho
Lucien Constantino
Luis Sorrilha (BigSP)
Luiz Humberto Sanches Farias
Marcelo de Almeida Siqueira (BiciCuba e Galeria do Artista)
Marcelo Império Grillo (MIG)
Márcia Regina de Andrade Prado
Márcio Campos
Mário Canna Pires
Matias Mignon Mickenhagen
Mathias Fingermann
Maurício Rodrigues de Souza
Otávio Remedio
Paula Cinquetti
Polly Rosa
Renata Falzoni (falzoni.com - nightbikers - espn/renatafalzoni)
Renato Panzoldo
Ricardo Shiota Yasuda
Ricardo Sobral (Bicicleta na Cidade)
Rodrigo Sampaio Primo
Ronaldo Toshio
Silvio Duarte Moris (silviobikersp)
Silvio Tambara (na medida do humano)
Tinho (Se Locomovendo na Selva de Pedra)
Thiago Benicchio (Apocalipse Motorizado)
Vado Gonçalves (Moonlight Bikers)
Vitor Leal Pinheiro (Quintal)
Willian Cruz (Vá de Bike!)

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